quarta-feira, 27 de março de 2024

As universidades transcendem fronteiras

Dentro do emaranhado de responsabilidades e impactos das universidades, se destaca a contribuição ao desenvolvimento econômico, especialmente para o desenvolvimento regional. Tal aspecto não somente ressalta o papel do saber no tecido social, mas também lança luz sobre as responsabilidades que carregam em fomentar a metamorfose e o progresso das comunidades que os circundam.

É de suma importância salientar que as universidades já se encontram imersas em um mar de atividades comunitárias. Contudo, espreita-se um potencial ainda mais grandioso, intrinsecamente ligado às demandas que emanam dos atores locais. Esta interação vibrante entre as academias e a comunidade não apenas enobrece sua missão educacional, mas também pode contribuir com soluções inovadoras diante dos desafios que se apresentam tanto no plano local quanto regional.

As diretrizes curriculares que norteiam os cursos superiores são elaboradas de modo a alinhar os saberes produzidos com as particularidades e demandas do local e da região. Este planejamento estratégico amplifica o impacto socioeconômico das universidades, posicionando-as como verdadeiros agentes catalisadores do progresso regional.

Observa-se, entretanto, que os setores fundamentais da agricultura e pecuária, do comércio e serviços, assim como o meio industrial, por vezes demandam escassamente estudos, pesquisas e serviços oriundos das universidades. Tal realidade denota uma oportunidade desconsiderada, prejudicial tanto para os meios econômicos quanto para os altos estudos. É de extrema urgência que estes setores despertem para a aliança valiosa que as universidades representam, e que busquem de forma proativa sua colaboração, visando aprimorar processos e práticas. Esta simbiose não somente impulsionaria inovações significativas, como também contribuiria de modo substancial para o crescimento e desenvolvimento econômico da região.

Com a proliferação de instituições de ensino superior, públicas e privadas, nas regiões, o tripé formado pelo ensino, pesquisa e extensão se transforma em um robusto motor para atendimento às demandas sociais. Quando as necessidades locais encontram o vasto conhecimento e capacidade técnica das universidades, propicia-se um terreno fértil para a expansão de projetos que não apenas são relevantes, mas também transformadores.

Nossa região possui uma diversidade de cursos em múltiplas áreas do conhecimento, prontos para encarar desafios econômicos e sociais com destreza e eficácia. Mas, para que esta colaboração entre as universidades e as comunidades locais se efetive em sua plenitude, é imprescindível que ambas as partes se aproximem sem reticências, almejando estabelecer parcerias frutíferas e duradouras. Esta interação recíproca não apenas se mostra benéfica, mas é de essencialidade ímpar para o desenvolvimento sustentável da região e vital para a existência das universidades.

A proximidade das universidades com os setores da economia transcende a mera vantagem, estabelecendo-se como pilar indispensável para o avanço social e econômico. Inspirando-nos na sabedoria do filósofo Hegel, que nos legou que “A realidade é racional, e o racional é real”, destacamos a preponderância de uma abordagem pragmática, firmemente alicerçada na realidade. É pela aplicação prática do saber, em consonância com as comunidades e setores econômicos locais, que as universidades cumprem plenamente seu papel social, transformando ideais em realidade tangível e promovendo significativamente o bem-estar social.


quarta-feira, 20 de março de 2024

A Realidade da inflação

Na divulgação da inflação de fevereiro, o governo federal expressou sua preocupação com o marcante aumento dos preços dos alimentos. Este súbito alarme é desprovido de justificativa. Desde a posse em janeiro de 2023, era de conhecimento da atual gestão que a inflação vinha apertando o cinto dos brasileiros, afetando com maior intensidade os estratos mais vulneráveis da população.

A escalada inflacionária, sobretudo no que tange aos preços dos alimentos, não é um fenômeno abrupto ou inesperado. A crise da Covid-19 exacerbou essa tendência, tornando insustentável qualquer alegação de surpresa ou espanto por parte das autoridades. Tal reação pode ser interpretada como uma tentativa de mascarar a inércia governamental frente a problemas cruciais que afligem a nação.

Não é necessário ser um especialista para notar a inflação galopante que assola o país. Qualquer trabalhador assalariado pode atestar o peso crescente dos custos de vida, com os preços dos alimentos ascendendo mês a mês. Estranha-se, portanto, a aparente negligência do governo federal em antever tal cenário.

Uma análise dos últimos quatro anos revela um panorama ainda mais alarmante. Entre 2020 e 2023, a inflação acumulada, medida pelo IPCA, atingiu 28,5%. No que se refere especificamente aos gastos com alimentação no domicílio, o incremento foi de 45,1%. Tais números evidenciam que o problema não é recente e que atribuí-lo a administrações passadas ou tratá-lo como uma novidade são estratégias que desviam o foco de responsabilidades imediatas.

O governo Lula, já familiarizado com as adversidades estruturais e conjunturais do país, deveria ter implementado políticas públicas eficazes desde o início de seu mandato para aliviar o sofrimento dos mais afetados. No entanto, as ações concretas para conter a escalada dos preços e melhorar as condições de vida da população foram insuficientes.

Os dados são implacáveis: apenas para citar alguns exemplos, o arroz branco teve um aumento de 89,8%, o feijão preto de 48,2%, o tomate de 143,1%, o açúcar cristal de 100,4%, e os ovos de galinha de 78,7% nos últimos quatro anos. Estes aumentos não são frutos de um único mês de descontrole, mas sim de um processo cumulativo que se estende desde janeiro de 2020.

Diante desse quadro, cabe questionar: o que foi feito pelo governo federal nos 14 primeiros meses de mandato para reverter ou ao menos mitigar essa tendência? A inércia observada contraria a expectativa de ação urgente diante de um problema tão palpável e cotidiano para a população brasileira.

Chega-se, então, ao ponto mais alto desta reflexão, evocando uma frase emblemática que marcou os discursos do presidente Lula em seus primeiros mandatos: “nunca antes na história deste país”. Infelizmente, esse lema hoje ressoa com uma ironia amarga, à medida que o governo parece mais preocupado com questões geopolíticas distantes do que com as adversidades enfrentadas diariamente pelos seus cidadãos.

É imperativo que o presidente e sua equipe recalibrem suas prioridades, limpando as lentes de sua visão social para perceber a realidade que se desdobra bem diante de seus olhos. A necessidade de uma visão menos míope, mais atenta às urgências locais, nunca foi tão premente. A população merece e espera por respostas concretas, não por retórica vazia ou promessas não cumpridas. O governo deve focar na melhoria da qualidade de vida de seus cidadãos em vez de se perder em falácias populistas ou preocupações externas que desviam a atenção do essencial: o bem-estar do povo brasileiro.


quarta-feira, 13 de março de 2024

Desafios do terceiro mandato

À medida que o Brasil navega pelo terceiro mandato presidencial de Luiz Inácio Lula da Silva, uma análise crítica das políticas e abordagens atuais do governo federal se faz necessária. A despeito do histórico político de Lula, que começou com um primeiro mandato promissor, seguido por um desempenho mediano no segundo, o cenário atual sugere que, sem uma mudança significativa de rota, seu terceiro mandato corre o risco de ser lembrado como um dos mais problemáticos do período pós-redemocratização do país.

Uma das críticas mais contundentes ao atual governo que se faz diz respeito à sua inclinação para uma maior interferência estatal na economia. Embora a intenção de regular e guiar a economia para um crescimento equitativo seja louvável, a maneira como isso está sendo proposto pelo presidente Lula, especialmente sua intenção de intervir nas decisões técnicas e nas indicações de empresas estatais e até mesmo na Vale (uma empresa que foi privatizada há décadas), revela uma abordagem preocupantemente intervencionista. Essa inclinação não apenas contraria a lógica de mercado e a autonomia empresarial, mas também ressuscita temores de uma governança excessivamente centralizada e politizada, que poderia prejudicar a eficiência e a competitividade no cenário global.

Além disso, a proposta de utilizar bancos públicos para forçar uma redução dos juros em um momento em que bancos centrais ao redor do mundo estão mantendo as taxas para combater a inflação, é particularmente alarmante. Embora a intenção de tornar o crédito mais acessível e estimular o crescimento econômico seja compreensível, essa estratégia ignora o contexto econômico global e os princípios básicos de política monetária. Com uma expectativa de inflação no Brasil persistindo na faixa de 3,5% para os próximos três anos, uma inflação dos alimentos em torno de 4% e um crescimento do PIB inferior a 2%, medidas populistas de curto prazo podem ter consequências desastrosas a longo prazo, incluindo a possibilidade de uma inflação descontrolada.

É crucial que o governo federal reconheça a importância de equilibrar intervenções estatais com as dinâmicas de mercado. Políticas econômicas não podem ser baseadas meramente em ideologias ou em tentativas de reverter privatizações passadas sem uma análise criteriosa dos potenciais impactos. A população brasileira merece e necessita de políticas que promovam o desenvolvimento sustentável, a estabilidade econômica e a inovação, em vez de medidas reativas que possam comprometer o futuro econômico do país.

Para que Lula evite a infeliz distinção de encerrar seu terceiro mandato como um dos menos eficazes da era pós-redemocratização, é necessário que haja uma reavaliação das estratégias atuais. O governo precisa adotar uma abordagem mais pragmática e menos ideológica, com políticas fundamentadas em dados concretos, análises técnicas e melhores práticas globais. A governança deve ser pautada pela eficiência, transparência e responsabilidade, priorizando o bem-estar a longo prazo da nação e de sua população.

Assim, urge que o presidente Lula e sua equipe governamental atuem menos com o “fígado” e mais com o “cérebro”. Decisões políticas e econômicas devem ser tomadas com cautela, consideração e baseadas em uma visão de futuro, não em reações emocionais ou inclinações ideológicas. O Brasil possui um potencial imenso para o progresso e a prosperidade, mas para que esse potencial seja realizado, é essencial que seus líderes escolham o caminho da razão, da inovação e da inclusão.


quarta-feira, 6 de março de 2024

A fiscalização cidadã

A fiscalização e o acompanhamento das despesas públicas, realizados pela sociedade civil, seja de forma organizada ou espontânea, constituem pilares fundamentais para a consolidação de uma democracia participativa e transparente. E o envolvimento da sociedade na elaboração e no monitoramento das propostas orçamentárias transcende um mero direito; trata-se de um exercício de cidadania que contribui para assegurar a utilização eficaz e eficiente dos recursos públicos.

Entretanto, observa-se uma carência de detalhamento nas propostas orçamentárias fornecidas por uma parte dos gestores públicos, particularmente em municípios de pequeno e médio porte. Frequentemente, programas e ações são descritos de forma genérica, sem especificar adequadamente metas quantitativas e qualitativas. Tal prática obstaculiza a avaliação da eficácia e da eficiência das políticas públicas e, por consequência, a correta utilização dos recursos públicos.

A declaração recente de Sergio Firpo, Secretário de Monitoramento e Avaliação de Políticas Públicas do Ministério do Planejamento, acerca do plano de reindustrialização lançado pelo governo federal, destaca a importância do monitoramento contínuo da execução das políticas públicas para garantir que seus objetivos sejam atingidos. Apesar de ser uma medida louvável no contexto federal, surgem questionamentos inevitáveis: essa metodologia de monitoramento e avaliação se estende a todas as iniciativas financiadas com recursos federais? E quanto aos municípios, será que práticas semelhantes de acompanhamento e análise estão em vigor?

No governo do estado do Paraná, o acompanhamento da execução das políticas públicas é uma prática consolidada há bastante tempo, algo que posso afirmar com base em minha própria experiência à frente da gestão de órgãos estaduais. Essa tarefa é realizada pela Secretaria de Estado do Planejamento, que conta com uma Coordenação de Monitoramento e Avaliação. Essa realidade levanta uma questão crucial: será que os municípios dispõem de estruturas equivalentes, como secretarias de planejamento e coordenações gerais, que sejam capazes de elaborar, monitorar e avaliar políticas públicas de maneira eficaz?

Adicionalmente, é necessário refletir sobre a capacidade dos gestores municipais de verdadeiramente compreender e planejar as demandas orçamentárias. O planejamento vai além de uma mera formalidade burocrática; trata-se de um processo estratégico fundamental na administração pública municipal, que deve ser conduzido com conhecimento, responsabilidade e transparência.

Portanto, torna-se imperativo que a sociedade civil, equipada com as informações e ferramentas adequadas, desempenhe um papel ativo no monitoramento das finanças públicas, demandando transparência, detalhamento e justificativas para as despesas planejadas. Apenas dessa maneira será possível garantir que os recursos públicos sejam empregados de forma a atender efetivamente às necessidades da população, contribuindo para uma gestão pública mais eficiente e democrática.

Na prática, observa-se um crescente obstáculo ao acesso de informações sobre a aplicação dos recursos públicos. Os portais de transparência não são adequadamente fiscalizados, e as informações, frequentemente apresentadas em relatórios contábeis complexos, tornam-se inacessíveis para cidadãos sem conhecimento técnico. A transparência deveria simplificar a compreensão dessas informações para todos. Espera-se que o Tribunal de Contas possa incentivar maior transparência por parte dos municípios.


quarta-feira, 28 de fevereiro de 2024

Planejar é preciso

A questão do planejamento é fundamental para toda a humanidade. Na vida pessoal, ele contribui para a definição de metas e objetivos, organização do tempo, antecipação de problemas e realização pessoal, entre outros benefícios. O mesmo se aplica às empresas, onde o planejamento auxilia na definição de direção estratégica, alocação de recursos, gestão de riscos e aumento da competitividade, entre várias outras.

A importância do planejamento se estende também ao setor público, e é evidenciado pela existência de um Ministério do Planejamento no governo federal. Este ministério tem atribuições que vão além da simples gestão do orçamento da União, incluindo o planejamento, a coordenação e a avaliação das políticas de gestão do governo federal. Portanto, esse ministério desempenha funções cruciais para nossa sociedade. O mesmo se aplica às secretarias de planejamento dos governos estaduais. No Paraná, por exemplo, a Secretaria de Estado do Planejamento é responsável por assessorar o governador, além de auxiliar no planejamento, coordenação e controle de todas as ações governamentais.

E quanto aos municípios? Será que eles contam com secretarias de planejamento que desempenham essas funções? São poucos os municípios que têm um órgão executivo dedicado ao planejamento e à coordenação geral das políticas públicas sob a designação de Secretaria de Planejamento. Alguns possuem uma coordenação geral, frequentemente vinculada ao gabinete do prefeito, porém suas funções tendem a ser mais políticas do que técnicas.

O ideal é que os municípios tenham uma secretaria de planejamento municipal com um corpo técnico qualificado, incluindo economistas e administradores. Este setor deve coordenar a elaboração do orçamento público municipal e monitorar sua execução, assegurando eficiência, eficácia e efetividade na utilização dos recursos públicos no financiamento das políticas públicas municipais.

Um dos princípios fundamentais do orçamento público é o da anualidade ou periodicidade, cujas raízes remontam à Idade Média. Este princípio determina que o orçamento público deve ser elaborado e aprovado para um período específico, denominado exercício financeiro, que geralmente corresponde ao ano civil. Isso implica que as receitas públicas arrecadadas em um determinado exercício financeiro devem ser aplicadas dentro desse mesmo período, em conformidade com outro princípio orçamentário importante: o do equilíbrio.

Para ilustrar, nos últimos quatro anos, conforme os dados do Sistema de Informações Contábeis e Fiscais do Setor Público Brasileiro (SICONFI) do Tesouro Nacional, os municípios do estado do Paraná registraram despesas empenhadas, mas não liquidadas, que somam R$ 12,5 bilhões. Isso significa que, embora os municípios tenham arrecadado recursos com a intenção de utilizá-los em benefício da população dentro do mesmo ano, tais recursos não foram efetivamente aplicados no período previsto, uma vez que a não liquidação indica que os serviços ou mercadorias contratadas não foram de fato recebidos no mesmo ano. Assim, os valores não foram adequadamente utilizados dentro do mesmo período.

O montante de recursos envolvido é significativo e, apesar da possibilidade de serem aplicados no exercício subsequente, resulta em atrasos no atendimento das necessidades da população. Uma solução eficaz para esse problema seria a implementação de uma secretaria de planejamento e coordenação geral nos municípios, dotadas de uma equipe técnica qualificada. Tal medida beneficiaria toda a sociedade de forma efetiva.


quarta-feira, 21 de fevereiro de 2024

Uma nova lente

À medida que o tempo avança, os líderes do governo federal começam a perceber que perderam a habilidade de gerir a economia eficientemente. A crítica é justificável, tendo em vista que, durante a campanha presidencial, foi amplamente divulgado que haveria uma revolução nesse aspecto. Isso nem deveria ser tão desafiador, considerando que o governo anterior também não apresentou resultados significativos na área econômica.

Os apoiadores do governo anterior podem argumentar que entregaram o governo com contas superavitárias. No entanto, questiono: a que custo? Para alcançar isso, mantiveram os gastos com emendas parlamentares e outros dispêndios discricionários, ao mesmo tempo em que as universidades federais foram paralisadas por falta de recursos. Além disso, houve uma redução drástica nos programas habitacionais e em outras iniciativas de apoio social. Essa situação chega a despertar nostalgia dos conservadores liberais da década de 1980.

Já os apoiadores do governo atual podem argumentar que a economia está em crescimento, que haverá aumento no emprego e que as contas públicas alcançarão o equilíbrio. Contudo, questiono: quando e de que maneira isso ocorrerá? Não observo medidas concretas que indiquem uma perspectiva positiva iminente. O Banco Central publicou uma prévia do desempenho econômico para o ano de 2023, que sugere uma tendência de desaceleração.

No início de 2023, as expectativas indicavam um crescimento econômico inferior a 1%. Ao longo do ano, essas projeções aumentaram para 2,11% e, em dezembro, havia um otimismo de que poderíamos atingir 2,95%. Contudo, a prévia do Banco Central aponta para um crescimento de 2,45%, comparado aos 2,9% de 2022, sinalizando uma desaceleração. 

Para 2024, as projeções indicam um crescimento de 1,6%, reforçando a percepção de desaceleração. Apesar disso, os defensores do governo mantêm a esperança de uma reviravolta significativa com a implementação de novas políticas públicas. Contudo, surgem as questões: quais políticas públicas serão essas? E com quais recursos serão financiadas?

Segundo o IBGE, o nível de ocupação no final de 2023 permaneceu praticamente inalterado em comparação ao final de 2022. No último trimestre de 2023, o país registrou 8 milhões de desempregados, 5,4 milhões de trabalhadores subocupados e 3,4 milhões de pessoas desalentadas. Nas grandes regiões, a redução do desemprego no último trimestre foi observada apenas no Sudeste. O governo acredita que os incentivos à indústria irão melhorar os indicadores de ocupação. 

Para impulsionar a ocupação, são essenciais incentivos ao setor de serviços, particularmente ao turismo. Contudo, antes disso, é preciso implementar um amplo programa de capacitação para equipar desempregados, subocupados e desalentados com as competências e habilidades necessárias para atuarem no setor de serviços.

A agricultura familiar representa outra valiosa oportunidade para gerar empregos e renda. No entanto, para viabilizar isso, é crucial eliminar os entraves nas cadeias produtivas que diminuem os lucros dos produtores familiares. O trabalho na agricultura familiar é árduo e, devido à baixa remuneração, atrai poucos interessados. Uma abordagem promissora é o modelo dos “Taobao Villages” na China, que tem contribuído significativamente para o desenvolvimento econômico e a revitalização rural no país. Existem alternativas viáveis; o que se faz necessário é que o governo utilize uma lente que corrija a miopia ideológica para poder enxergar o país como ele está e não como eles imaginam.


quarta-feira, 7 de fevereiro de 2024

Tempestade no horizonte

Os principais desafios enfrentados pelo governo federal parecem ser o embate com o Congresso Nacional em relação às emendas parlamentares, que alcançaram o valor expressivo de R$ 53 bilhões, e o desempenho da economia. Essas duas questões estão interconectadas e a estratégia política do governo inclui o fortalecimento dos partidos ideologicamente aliados visando às eleições municipais.

Em uma entrevista recente, a deputada federal e presidente do PT, Gleisi Hoffmann, expressou críticas à aprovação das emendas, manifestou apoio ao veto parcial do presidente e divergiu do ministro Fernando Haddad, que defende uma meta de resultado fiscal zero. Ela argumentou que a meta deve ser de crescimento econômico, estabelecendo uma meta ambiciosa de 4% de crescimento para este ano. Justificou sua posição alegando que uma parte importante do crescimento de 2023 foi impulsionada pela PEC da Transição, que facilitou a retomada dos programas sociais.

De fato, não se pode dizer que ela esteja completamente equivocada. É necessário reconhecer que os programas sociais contribuíram para o crescimento econômico de 2023, embora não representem sua maior parcela. Omitiu-se que a PEC da Transição, ao ser implementada junto a uma previsão de déficit primário, resultou em um dos maiores déficits primários nominais dos últimos anos, excetuando os anos da pandemia. No ano de 2023, o déficit primário alcançou R$ 230,5 bilhões, enquanto o déficit nominal chegou a R$ 696,8 bilhões.

O crescimento do consumo das famílias contribuiu para pressionar a inflação que, combinado com o déficit fiscal, impediram o Banco Central de reduzir a taxa básica de juros da economia. Esse cenário manteve os custos operacionais para as empresas em níveis muito altos. Estamos, mais uma vez, diante da formação de uma “tempestade perfeita” na nossa economia.

A meta de resultado fiscal zero estabelecida pelo ministro Haddad dificilmente será atingida. Diante do embate com o Congresso Nacional, é provável que o governo tenha que manter as emendas parlamentares sem cortes. Embora possam tentar disfarçar, é improvável que vençam essa disputa. Isso exigirá uma maior arrecadação ou a redução de despesas em outras áreas para compensar. No entanto, cortar gastos em um ano eleitoral, quando a estratégia do governo é ganhar eleições, não parece viável, e espera-se que os gastos aumentem. Uma possível fonte de financiamento seria a PEC de reoneração da folha de pagamentos, mas é pouco provável que o Congresso Nacional a aprove.

O governo enfrentará dificuldades para aumentar a arrecadação e precisará apoiar estados e municípios que provavelmente não terão um ano fiscal favorável. Como sugerido implicitamente pela deputada Gleisi, o governo terá de aceitar a realidade de um déficit fiscal. Atualmente, projeta-se um déficit primário de R$ 91 bilhões e um déficit nominal de R$ 770 bilhões, mas esses valores podem aumentar.

Portanto, a formação de uma “tempestade perfeita” é justificada pela combinação de inflação persistentemente alta, déficit fiscal significativo devido à política fiscal expansionista que aumentará a dívida pública, e juros moderadamente altos para financiar o déficit. Diante desse cenário, surge a questão: é possível alcançar o crescimento de 4% almejado pela deputada? Acredito que sim, mas haverá consequências futuras, pois “não há almoço grátis”. Parece que o governo está determinado a vencer as eleições a qualquer custo. A tempestade está se formando, e podemos nos encontrar no “olho do furacão” em breve.