É muito comum identificarmos municípios atolados em dívidas, com comprometimento excessivo da receita corrente líquida em despesas obrigatórias. Em muitos casos, o percentual gasto com pessoal já ultrapassa o limite prudencial imposto pela Lei de Responsabilidade Fiscal, impedindo até mesmo a concessão da data-base. A gestão tem se tornado refém de uma máquina pública inchada, pouco eficiente e financeiramente insustentável.
Muitos municípios simplesmente não dispõem mais de margem financeira para executar políticas públicas básicas, como saúde, educação, assistência social e infraestrutura. Entenda-se aqui “dificuldade financeira” como a incapacidade real de financiar as ações e serviços públicos que a população necessita e que deveriam ser garantidos de forma contínua e qualificada pelo município.
Grande parte dessa situação deriva da ampliação, no passado, das despesas obrigatórias, sem a correspondente previsão de receitas permanentes. Cargos comissionados, gratificações, excesso de horas extras e planos de cargos e salários mal estruturados, muitas vezes feitas às vésperas de eleições, aumentaram de forma descontrolada o custo fixo das prefeituras. Muitos desses atos administrativos foram claramente movidos por interesse pessoal ou político, revelando um completo descompromisso com a sustentabilidade das finanças públicas.
Outro agravante é a judicialização de direitos dos servidores. A ausência de diálogo institucional e o descumprimento da legislação por parte de alguns gestores levaram a uma enxurrada de ações judiciais que resultaram em precatórios. Está estabelecido que 2,56% da Receita Corrente Líquida dos municípios devem ser utilizados para pagamento de precatórios. Embora a medida busque dar previsibilidade ao cumprimento dessas obrigações, somada a outras vinculações constitucionais, ela tem estrangulado ainda mais a capacidade de investimento dos municípios.
Diante desse cenário, a Proposta de Emenda Constitucional nº 66, que está em discussão no Congresso Nacional, surge como uma medida de alívio fiscal. A proposta prevê o reparcelamento das dívidas previdenciárias e a flexibilização do pagamento de precatórios, o que pode criar um fôlego necessário para que as prefeituras retomem a capacidade de planejamento e execução de políticas públicas. Contudo, sua tramitação no Congresso Nacional exige atenção e pressão por parte da sociedade civil. É preciso cobrar dos parlamentares sensibilidade para com os municípios, mas também responsabilidade para assegurar que o novo espaço fiscal seja bem utilizado.
Mais do que um rearranjo contábil, o que se impõe é uma mudança de postura na gestão pública municipal. Ética, responsabilidade e planejamento de longo prazo devem ser pilares inegociáveis de qualquer governo. E tão importante quanto olhar para o futuro é responsabilizar quem no passado agiu de forma temerária, onerando a sociedade e comprometendo a vida de milhões de brasileiros. A impunidade de más gestões perpetua a cultura do descaso com o bem público.