domingo, 22 de setembro de 2019

Liberdade necessária

“Liberdade, liberdade! Abre as asas sobre nós”. O samba enredo da Imperatriz Leopoldinense do ano de 1989 parece ser o novo hit do momento para o governo Bolsonaro. O presidente sancionou a tão comentada e esperada MP da Liberdade Econômica. Trata-se de uma proposta para desburocratizar um pouco a criação e a manutenção de empresas, principalmente as micros e pequenas.

Há, na cabeça do governo e de seus asseclas, que o texto da MP convertida em lei por si só poderá amenizar a questão do desemprego no país. É claro que as coisas não são tão simples, assim. O problema do desemprego não se resolverá com uma nova legislação, mas com a implementação de políticas públicas estruturantes. Não se trata somente de dar incentivos para empregadores e vantagens para os empregados, a questão é muito mais profunda. É estrutural.

A economia tem que retomar o crescimento de forma sustentável, sem os chamados “voos de galinha”. Nos últimos anos este evento se tornou quase que cíclico em nosso país.

O escopo da agora Lei da Liberdade Econômica é muito bom, mas tem que vir acompanhado de outras ações combinadas. Na prática ela dispensa a necessidade de controle de ponto para empresas com até 20 funcionários, elimina a necessidade de alvarás para atividades de baixo risco e preserva o patrimônio dos sócios da empresa contra exigências de quitação de débitos da empresa.

A Secretaria de Política Econômica estima que a ação da nova legislação deverá criar cerca de 3,7 milhões de empregos e promover o crescimento da economia em 7%, num horizonte de 10 anos. Pode ser que isto aconteça, mas ainda é pouco. Não se trata de negativismo ou de contrariedade a tudo que o governo propõe, trata-se de ter a coerência de compreender que a situação econômica do país é muito grave e que não estamos vendo perspectivas de melhora pela falta de ação efetiva de políticas públicas.

E as falas de Bolsonaro continuam não ajudando. Em discurso ele afirmou que tem falado com o ministro da Economia, Paulo Guedes, que o governo tem que ter um projeto “Minha Primeira Empresa” ao invés do projeto “Meu Primeiro Emprego”. Poderia ser cômico se não fosse verdade. Concordo que o número de empresas poderia ser maior, mas para que isto ocorra o ambiente econômico interno e externo tem que estar favorável, o nível de escolaridade da população teria que aumentar e as políticas públicas de apoio ao empreendedorismo deveriam ser mais consistentes.

O contido na nova lei é muito bom e já deveria ter sido aprovado há muito tempo, mas temos que ter a clareza que há pontos polêmicos no novo texto. Em caso de dívidas de uma empresa, inclusive trabalhistas, se a empresa não tiver patrimônio não poderá utilizar o patrimônio dos sócios para a quitação dos débitos. Isto quer dizer que os trabalhadores e credores de empresas devedoras não terão mais a proteção da legislação para receber o que lhes é devido. Também poderá facilitar o acobertamento de eventuais sonegações de pagamento de horas extras, uma vez que poderá não ter o registro de ponto.

Mas o governo tem que comemorar mais esta ação, sim. Ela é boa. Veio apartada de outras medidas, mas em seu escopo é um avanço. Resta saber o que virá para complementar estas ações para ajudar o país a crescer e a gerar mais empregos, até que o sonho da primeira empresa substituindo o sonho do emprego se torne realidade e seja capaz de gerar renda para pagar as contas de todos os brasileiros. Tomara que, como no samba, “a voz da igualdade seja sempre a nossa voz” e não mais um rompante governista para ludibriar o povo.

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