quarta-feira, 15 de fevereiro de 2023

Usando as ferramentas

O novo grande embate público está sendo a investida brutal do presidente Lula e de seus seguidores contra o presidente do Banco Central do Brasil (BCB). A crítica é com a manutenção dos juros elevados e com as observações constantes nos comunicados e atas do Comitê de Política Monetária (Copom) sobre o cenário fiscal preocupante que gera déficits e aumento do endividamento. Quem está certo?

De certa forma os dois lados têm suas razões. Pelo lado do governo temos que considerar que os juros estão extremamente elevados e isto encarece a produção e reduz o nível de atividade inibindo ou desacelerando a geração de emprego e renda. Mas pelo lado do Copom, eles também estão certos, pois desde o final da década de 1990 o país utiliza o sistema de metas para o controle da inflação que é baseado na inflação futura e nos juros.

O governo assumiu ansioso em cumprir as promessas de campanha e já elegeu os culpados caso não logrem êxito na transformação social prometida. O governo critica os juros que se caracterizam na maior taxa de juros real do mundo: 7,52% ao ano. Só que esquecem que no final do primeiro ano do primeiro governo Lula (2003) a Selic estava em 16,50% ao ano e a inflação do ano ficou em 9,30% resultando numa taxa de juros real de 6,59%.

No final do primeiro mandato de Lula (2006) a Selic estava em 13,25% ao ano e a inflação daquele ano foi de 3,14%. A inflação somente baixou com a manutenção dos juros elevados. No final de 2006 os juros reais estavam em 9,80% ao ano. Este cenário somente se reverteu no governo Dilma quando a presidente insistiu na não elevação dos juros e como resultado tivemos a disparada da inflação, o aumento do déficit público e uma das maiores crises econômicas de nossa história.

Um conhecimento econômico básico que é professado em todos os cursos de Economia do mundo é que a inflação é um dos maiores males que podemos ter numa sociedade. Ela corrói o poder aquisitivo do dinheiro e empobrece a sociedade. Também é ensinado que juros elevados inibem o investimento e encarecem o custo do capital, desacelerando a atividade econômica. Inflação e juros elevados são ruins. Por isto as autoridades econômicas devem monitorar e acompanhar suas evoluções.

Quando o Copom decide manter os juros nos níveis atuais é porque a inflação futura está com tendência de alta. Neste caso nem estão focando muito a inflação deste ano, mas perseguem o objetivo de colocar a inflação de 2024 dentro da meta. A inflação deste ano dificilmente ficará dentro dos intervalos da meta. Mas o presidente chegou a falar que não tem problema ter um pouco mais de inflação. Como assim? É claro que tem problema.

Uma inflação maior não será tão ruim somente para o governo que irá arrecadar mais e, com isto, reduz-se o déficit fiscal projetado. Mas e a população em geral? Poucas categorias tiveram a reposição da inflação nos últimos anos. E aceitaram isto para manter seus empregos. O que o governo irá fazer para mudar este cenário? 

É claro que não estou defendendo a manutenção dos juros em patamares elevados, mas só argumentando que algo mais deva ser feito para reorganizar nossa economia. E isto passa por uma profunda reforma administrativa do setor público, na melhoria da eficiência dos gastos públicos e por uma reforma tributária que reduza os impostos sobre o consumo. Obviamente, isto tem que ser acompanhado de investimentos em pesquisas para melhorar nossa tecnologia e a produtividade. Não se resolve o problema questionando as ferramentas existentes. É necessário saber usá-las.


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