quarta-feira, 16 de junho de 2021

Rumo a uma renda de cidadania

Há muitos anos convidei o então senador Eduardo Suplicy para palestrar num evento de Economia na FECEA. Ele havia publicado um livro que abordava a necessidade de o país ter um programa de renda mínima e esta foi a temática de sua apresentação. O assunto sempre foi polêmico e muitas pessoas faziam (e fazem) críticas asseverando que “não se deve dar o peixe, deve-se ensinar a pescar”.

Como consequência de sua militância no assunto o senador propôs e foi aprovada e sancionada a Lei Federal nº 10.835/2004, que institui a renda básica de cidadania. Nela ficou estabelecido o pagamento de uma renda mínima universal a qualquer cidadão residente no país há mais de cinco anos. Esta lei está até hoje aguardando a sua regulamentação.

Neste contexto, mesmo sem a efetiva implantação da renda básica de cidadania, tivemos uma evolução na implementação de políticas sociais com o objetivo de transferir renda para os mais necessitados. As primeiras políticas desta natureza foram implementadas no governo FHC e posteriormente potencializadas no governo Lula, sempre sofrendo críticas dos mais conservadores. O que muitas pessoas não querem enxergar é que estas políticas são comuns no mundo e não é exclusividade de países com governos progressistas.

A experiência brasileira foi exitosa e conseguiu reduzir a vulnerabilidade social. Só que as crises vivenciadas no governo Dilma trataram de agravar os indicadores sociais que resultou no aumento da pobreza no país, o que elevou o total de pessoas na pobreza para 23,3 milhões no final do ano de 2017. Em 2019 já tínhamos 24 milhões de pessoas na pobreza. Com a crise econômica causada pela pandemia tivemos o aumento de pessoas na pobreza alcançando um total de 35 milhões, segundo a FGV Social.

O pagamento do auxílio emergencial em 2020 amenizou esta situação, porém com a sua descontinuidade voltamos a ter os números agravados. Com a sua retomada, mesmo que em valores menores, tivemos a situação amenizada. Mas a pergunta que temos que fazer é: o que acontecerá quando o pagamento do auxílio emergencial encerrar?

Pois bem, por mais que algumas pessoas torçam o nariz quando se fala em auxílio financeiro a verdade é que nossa economia depende dele, assim como os seus beneficiários. O crescimento de nossa economia, assim como das demais economias do globo, dependem do consumo das famílias e com a crise econômica o PIB encolheu porque as pessoas perderam capacidade de consumo e isto precisa ser tratado com a devida prioridade e responsabilidade por parte de nossos governantes. Não se trata de pregar que o governo “sustente” pessoas que não trabalham, mas que o governo garanta um mínimo de dignidade para os mais necessitados.

Mesmo o governo Bolsonaro, que foi eleito com uma retórica liberal e reformista, se rendeu ao pagamento de auxílios financeiros para impulsionar a sua aprovação e popularidade. Nesta linha o STF já decidiu que a lei da renda mínima deve ser cumprida respeitando as regras fiscais. Com efeito o governo federal pretende regulamentar a lei este ano para poder implementar em 2022, de olho nas eleições. Ainda temos mais duas leis tramitando sobre o assunto.

Independente das distorções de objetivos o escopo das propostas converge para a ideia original de Suplicy, demonstrando que tanto os progressistas quanto os mais conservadores estão empenhados em implementar um programa de transferência de renda aos mais necessitados. Resta saber como financiarão estes programas, uma vez que a população não aguenta pagar mais impostos.

0 comentários:

Postar um comentário